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sábado, 30 de março de 2013

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APRESENTAÇÃO


O programa de Pós-graduação em Cultura e Territorialidades (PPCULT), aprovado em 2012 pela CAPES, é resultado de uma demanda de docentes e discentes da Universidade Federal Fluminense por um maior investimento em pesquisas e estudos no campo da cultura, dada sua crescente importância na contemporaneidade. Reunindo, em sua fundação, 15 docentes (doze permanentes) das mais diversas áreas (como Produção Cultural, Estudos Culturais e Mídia, Educação, Antropologia, História, Letras, Sociologia, Comunicação etc.), alinhavados pelo campo de suas pesquisas e reflexões atreladas ao estudo da cultura em múltiplas acepções, em especial no que tange às discussões sobre espacialidades e territorialidades, tanto materiais quanto simbólicas, a nova Pós encontra seu lugar de inserção por excelência dentro de uma perspectiva multidisciplinar.
O novo Programa, no entanto, tem sua base no Departamento de Arte e onde está ubicado o curso de graduação em Produção Cultural (do qual origina-se a maior parte dos professores que constituem o corpo docente da pós), e contará com apoio de professores do curso de Estudos de Mídia, do Departamento de Estudos Culturais e Mídia. Ambos os cursos/departamentos estão inseridos no Instituto de Arte e Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense (IACS/UFF). Em suas linhas de pesquisa, disciplinas e projetos, a interseção pretendida pelo novo Programa é reunir em um viés multidisciplinar pesquisadores que privilegiem as discussões sobre cultura em sua relação com as territorialidades e seus múltiplos agentes e práticas.
A Cultura, como valor estratégico, assumiu na última década, relevante e central papel, dando à sociedade atual as feições que definem a contemporaneidade. Desta forma a criação de um programa de pós-graduação que engendra cultura e prima pela interdisciplinaridade responde a uma demanda crescente e a uma lacuna significativa no que diz respeito à formação superior stricto sensu no país.
Se entendemos que a cultura é parte constitutiva de toda prática social e que na contemporaneidade essa dimensão ocupa cada vez mais um lugar central, acreditamos que olhar para a questão da cultura é hoje fundamental para mapearmos formas de atuação política. Há, neste sentido, uma dupla imbricação entre cultura e política: em primeiro lugar, a produção de significado é dimensão fundante da luta política, ou seja, é preciso entender as formas de ação política em sua relação com as práticas culturais; em segundo lugar, e cada vez mais, essa associação se externaliza e se assume, levando à constituição de políticas culturais expressivas, em que o sentido da cultura desliza entre forma de ação política, no sentido de intervenção no mundo, forma de construção de subjetividades e identidades pessoais e grupais e forma de mercadoria, dentro de uma lógica de produtividade, distribuição, consumo, fruição e descarte.
Tais imbricações se consolidam e adensam dentro da realidade das sociedades contemporâneas, múltiplas e complexas, em que as relações espaço e tempo são continuamente alteradas pelas práticas culturais. Portanto, há uma forte interseção entre o campo da cultura e suas múltiplas dimensões espaciais, tanto em termos materiais quanto simbólicos, pressupondo relações processuais com os territórios em que se dão tais relações. Neste sentido, a proposta de pensarmos as territorialidades, entendendo que os territórios são espaços em construção, lugares em processo de significação, objetos de disputas e negociações, em que a cultura exerce papel central, é também eixo estratégico de nossa proposta. Principalmente se levarmos em consideração o quanto, na contemporaneidade, os espaços das cidades, suas tessituras, as redes sociais e virtuais que englobam, seus múltiplos usos, formas de apropriação, exclusão, inclusão e luta, são atravessados pelas práticas culturais, podemos concluir que cultura e territorialidade são conceitos interdisciplinares, por excelência, e demandam estratégias metodológicas plurais que estão relacionadas à tradição reflexiva das diferentes áreas das quais se originam os professores do corpo docente que compõem este Programa de Pós-graduação.
Por estas razões, o Programa Cultura e Territorialidades é estratégico. Deve ser considerado, também, que a II Conferência Nacional de Cultura (CNC), em 2010, apontou algumas diretrizes prioritárias, entre elas a ampliação da formação na área, para permitir e potencializar a institucionalização pública do campo cultural, como aponta a criação do Sistema Nacional de Cultura (SNC) e demais frentes das Políticas Publicas de Cultura. Portanto, em consonância com a contemporaneidade, as Políticas de Cultura vem demandando, de forma crescente, gestores, educadores, pesquisadores e analistas com aperfeiçoamento no campo cultural.
Mas indo além, é preciso ressaltar que ampliar as oportunidades de pesquisa na área significa valorizar o aprofundamento teórico que se reflete na qualificação das ações e do debate no campo. Por isso, a experiência do corpo docente em pesquisas nas áreas correlatas às temáticas principais deste Programa de pós-graduação – Cultura e Territorialidades –, com suas formações interdisciplinares, se constitui em capital diferenciado para a construção deste projeto, que requer olhares reflexivos complexos e múltiplos, como os que vêm sendo desenvolvidos por estes docentes, para dar conta de uma realidade sócio-cultural de enorme complexidade, em constante processo de mudança e atualização. Em um mundo de fluidez de fronteiras no campo da cultura e nas dimensões do tempo e do espaço, formar pesquisadores capazes de refletirem sobre essa realidade é demanda fundamental para fortalecer a compreensão em tempos contemporâneos.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

LEI GRIÔ E A VALORIZAÇÃO DA CULTURA ORAL

Lei Griô, em tramitação no congresso nacional, tem como objetivo a valorização dos mestres e mestras portadores dos saberes e fazeres da cultura oral e o fomento da transmissão desta tradição. Seu principal mecanismo é a oferta de bolsas de incentivo para os griôs, mestres da tradição oral, para que eles promovam o encontro de tais saberes com a educação formal através de encontros regulares de compartilhamento e troca de experiências de educação e cultura.
No Rio Grande do Sul, está em discussão a Lei Griô estadual, que, a exemplo da lei nacional, também pretende a valorização e a preservação dos mestres da tradição oral. Para o coordenador da Política de Pontos de Cultura da Secretaria de Cultura do Rio Grande do Sul, João Pontes, a lei é, acima de tudo, o reconhecimento de que a tradição oral é um saber historicamente construído e que as formas de saberes populares se construíram a partir dessa dinâmica. “Trata-se de todo um conjunto de construções, signos e significados que, em muitos contextos, foram responsáveis por possibilitar formas de organização alternativas à própria perspectiva da dominação das culturas hegemônicas. Muito do que nós somos enquanto sociedade, enquanto grupos culturais, vem desse conjunto de saberes construídos e compartilhados pelos grupos populares”, afirmou o coordenador.
“Além disso, uma política pública tal a que está previsto na Lei Griô nos possibilita também um repensar sobre a perspectiva da educação formal. Vivemos uma separação institucional entre Educação e Cultura que, por um lado, reproduz uma Educação palpada numa lógica um tanto quanto positivista, uma tentativa de descolamento do contexto cultural, em que pese a Educação também ser cultural. Por outro lado, temos políticas de Cultura que não se compreendem enquanto processos educativos e pedagógicos. Nesse contexto e dentro desses objetivos que a gente discute a valorização e o reconhecimento da tradição oral”, afirmou João.
Lilian Pacheco, do Ponto de Cultura Grãos de Luz e Griô, de Lençóis, na Bahia, explica que a Lei Griô do Rio Grande do Sul é a mesma proposta em tramitação no congresso nacional, mas já estadualizada. “Isso é muito bom porque quando a lei nacional for votada, uma alimenta a outra em termos de mobilização e em termos de tramitação. A Paraíba também está dando entrada na sua Lei Griô”, contou.
Segundo Lilian, antes da Lei Griô alguns estados já contavam com a Lei dos Mestres. “Mas ela é mais restrita, nela não existe a proposta dialógica com a educação e é uma lei mais assistencial, não tem essa proposta de fortalecimento da transmissão oral”, disse ao explicar que, para a formulação da Lei Griô, foi feito um estudo das leis já existentes no Brasil e também em outros países. “A gente fundamentou a lei nessas experiências para mostrar que não é uma assistência que precisa ser feita, é preciso ser feita a inclusão social do mestre e da sua comunidade e para isso é preciso um diálogo com as organizações e instituições locais, que é o que propõe a Lei Griô”, afirmou.
O termo griô tem origem em uma figura da tradição oral africana responsável pela transmissão do conhecimento da comunidade. “Quando a gente traz esse nome como referência, como simbologia, não significa que a pessoa tenha que ser algum tipo específico de mestre, é apenas uma simbologia para que se valorize a tradição oral como foi valorizada, por exemplo, no Mali, que é de onde vem essa palavra que nós trouxemos”, explicou Lilian. “Mas o griô é o que ele é em cada comunidade, em cada tradição, ele é a figura responsável pela transmissão oral e por um saber de transmissão oral. Ele está em diversas formas de expressão e de manifestação no nosso país, um cordelista, uma mãe de santo, um tocador de zabumba, um contador de histórias, um pajé. São vários lugares socioculturais que nós temos no Brasil que são ocupados pela figura responsável por manter a sabedoria, cuidar daquela sabedoria e transmiti-la oralmente, passar de geração em geração. O conceito de griô é isso, ele é o que ele é na sua comunidade, no lugar tradicional que ele ocupa”, disse.
Lei Griô traz também a figura do griô aprendiz, pessoa que, junto ao mestre, tem a responsabilidade de levar a transmissão da cultura oral às escolas da educação formal. “É uma pessoa da comunidade que vem de diversas áreas, da antropologia, da educação, da própria militância cultural, das artes. São pessoas de diversas áreas e linguagens que estão nessa caminhada de aprender com os griôs e mestres e ao mesmo tempo de levar isso para as escolas, de fazer essa ponte entre a tradição oral e a educação formal”, explicou Lilian.
O griô aprendiz aprende com o griô e o leva às escolas, ou leva os estudantes, junto com o educador, para conhecer a oficina do griô e sua tradição. “Isso faz a sala de aula crescer, se ampliar e ir para a comunidade, paras as festas, para a casa de farinha, até o cantador. O griô aprendiz vai construir essa didática de diálogo entre um saber e o outro”, disse Lilian.
O processo se dá através de um projeto pedagógico criado em parceria com as escolas e com a comunidade, conforme também está previsto pela Lei Griô. “Praticando essa mediação, a gente foi criando uma pedagogia, a pedagogia griô. Ela se fundamenta nas próprias práticas da tradição oral que a gente aprendeu e em algumas áreas da educação que são revolucionárias, dialógicas, como Paulo Freire, como a educação biocêntrica, a educação para as relações étnico-raciais positivas de Vanda Machado. São referências que a gente trabalha para poder criar uma base pedagógica eficiente, encantadora, mobilizadora, dialógica e que contemple a oralidade e a corporalidade, para ser coerente com as tradições”, contou Lilian.
Bernardo Vianna / blog Acesso
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